Tenho pensado (e lido e ouvido) muito sobre amizade, talvez como efeito da pandemia, que tanto mexeu com os relacionamentos.
Uma amiga que mora no exterior me contou esses dias como seu grupo de amigos brasileiros que tambĂ©m moram na cidade virou quase uma famĂlia, jĂĄ que ninguĂ©m tem parentes prĂłximos lĂĄ. E que ela acha engraçado que, quando olha para aquelas pessoas, pensa que dificilmente seriam prĂłximas no Brasil, por terem perfis muito diferentes ou por virem de situaçÔes em que seria improvĂĄvel que se cruzassem.
Me pareceu um bom exemplo de como a amizade sempre tem um carĂĄter circunstancial. As pessoas com quem se convive e a frequĂȘncia com que vocĂȘ as vĂȘ tem muito a ver com onde vocĂȘ mora, qual seu trabalho, se vocĂȘ tem um cĂŽnjuge e quem Ă© essa pessoa, se tem filhos, que tipo de lugar frequenta, se seus pais ou outros parentes moram perto, se hĂĄ outros amigos em comum. E Ă s vezes isso conta mais do que a afinidade.
Então mudanças nas circunstùncias vão fazendo com que manter certas amizades se torne um desafio - ouvi uma pesquisadora num podcast gringo que, em média, a cada sete anos de vida perdemos metade dos nossos amigos (!).
Isso tambĂ©m tem a ver, claro, com mudanças de interesses e outras transformaçÔes mais internas. E com o fato de as pessoas passarem a se voltar mais para nĂșcleos familiares e parcerias amorosas em detrimento dos amigos â o que eu sempre acho meio limitante. Seria muito bom se fosse mais comum convidar os amigos para, sei lĂĄ, passar o Natal junto.
Tem gente que eu gostaria de ver mais, mas as agendas e as vontades nĂŁo batem por um milhĂŁo de pequenos fatores que Ă© difĂcil desembaralhar para entender. Entre essas, algumas eu vejo uma vez por ano e parece que a conexĂŁo se conserva. JĂĄ com outras vou percebendo, com algum pesar, que aquela liga tĂŁo preciosa & complexa que nos unia se perdeu em algum lugar do espaço-tempo e o que ficou nĂŁo tem mais fĂŽlego para seguir.
Muitas das minhas amizades mais queridas sĂŁo mantidas hoje na base de longos ĂĄudios e encontros virtuais. Ă linda essa possibilidade de se relacionar online, mas o convĂvio olho no olho nĂŁo Ă© substituĂvel. NĂŁo sei se dĂĄ para criar memĂłrias por videochamada.
No fim, tenho achado importante perceber que
Ă© preciso desconstruir a ideia do amigo pra tudo
assim como se deve fazer com cĂŽnjuges, aliĂĄs. Tem amigo que Ă© legal para viajar junto, outro que provĂȘ mais apoio emocional, outro mais afeito a falar mais sobre trabalho e amenidades.
pessoas lidam com amizades de maneira diferentes
tem gente que manda mensagem sempre (e tambĂ©m requer essa atenção), tem gente que fica um tempĂŁo sem aparecer. Tem gente que propĂ”e os rolĂȘs, tem gente que espera ser convidada.
estar perto exige intenção e algum trabalho
para nĂŁo ser engolido pelas circunstĂąncias, uma atitude proativa em alguma medida Ă© necessĂĄria, nem que seja mandar uma palavrinha pelo zap.
algumas pessoas passam
e vĂŁo ficando no âvamos marcar alguma coisaâ atĂ© que nem essas mensagens chegam mais.
E talvez ao mesmo tempo em que trabalhamos para aceitar essa impermanĂȘncia das amizades dĂȘ tambĂ©m para construir outras lĂłgicas de se relacionar nesse sentido, mais atenciosas, mais abertas, mais abrangentes, inclusive para a chegada de novos amigos.
PRA RESPIRAR
Uma das coisas mais Ășteis que aprendi na yoga e voltei a fazer diariamente Ă© o pranayama âNadi Shodanaâ, ou respiração das narinas alternadas, que dĂĄ uma equilibrada geral na cuca.
PRA OUVIR:
Muito bem produzido o podcast O Veneno Mora ao Lado, que explica em seis episódios com pequenas reportagens como tanto agrotóxico veio parar na nossa comida.
PRA ASSISTIR:
Fiquei com o coração na boca com documentĂĄrio Free Solo (na Disney+), que ganhou o Oscar em 2019. Ă sobre um brother que pratica escalada sem cordas, um esporte perigosĂssimo (e imprudente), e resolve subir um pedrĂŁo de 900 metros de altura.
PRA LER:
Encontraram ruĂnas de pirĂąmides e cidades na AmazĂŽnia peruana
A histĂłria do condomĂnio sĂł para domĂ©sticas na Bahia
âAs pessoas conferem um poder Ă s medicaçÔes psiquiĂĄtricas que no fundo elas nĂŁo tĂȘmâ
40 artistas dĂŁo dicas para trabalhar com criatividade (em inglĂȘs)
Nas fĂ©rias li a trilogia Esboço, da escritora canadense-britĂąnica Rachel Cusk, e gostei demais. NĂŁo tem exatamente uma estrutura de trilogia, o que significa que vocĂȘ pode ler o primeiro livro sem nenhuma intenção de comprar os outros dois. A histĂłria (ou nĂŁo-histĂłria) paira ao redor de uma protagonista quase invisĂvel que relata o que ouve de conhecidos e estranhos.
PRA CRIAR:
Toda semana eu passo algum tempo garimpando cursos na Domestika. Tem coisa por 30 pilas (!)
PRA VIAJAR:
Fiz um trampo para o Airbnb com rotas de viagem de natureza pelo Brasil e achei que ficou uma graça (ainda mais com as ilustraçÔes da Jana Glatt <3)